“Salve Maria”

Uma tarde fui ao bairro Muda da Tijuca, zona Norte da cidade do Rio de Janeiro, para uma visitinha a um casal de tios. Repetia esta visitinha com certa regularidade. Ao sair de lá, peguei a rua principal, onde transitavam os ônibus. Distância curta para minha casa. Ao caminhar para o ponto do ônibus, me deparo com um antigo companheiro de colégio, com quem por muitos anos continuei a encontrar, pois morávamos em ruas vizinhas na Tijuca.

Sérgio era o nome dele. Educado, pouco falante, muito bom aluno, tendo ingressado na Faculdade de Medicina logo ao terminar o então curso científico. Sempre se mostrou muito católico, mesmo após ter saído do colégio dos padres.  Certas conversas eram evitadas na sua presença. Ficava-se constrangido, ele mais ainda.  Adquirira o hábito de repetir sempre uma conhecida saudação religiosa.  De repente, intercalava em sua fala um “Salve Maria”, para exortar uma ação comentada ou afastar um mau exemplo mencionado, a que alguns repetiam com todo respeito ou na gozação. Chegava muitas vezes a incomodar o bate-papo. Mas ele nem estava aí.

Mas de onde vinha o Sérgio quando nos encontramos na rua perto de um ponto de ônibus. Deu para ver muito bem. De uma casa conhecida nas redondezas por abrigar prostitutas. Duas delas, maduronas, estavam quase sempre à janela da casa, sorrindo. Sérgio ficou muito atrapalhado ao me ver, afastando-me com os braços para longe dali.

Oi, amigo, como vai? Você por aqui? Ia tomar o ônibus para casa, depois de visitar uns tios. “Salve Maria” foi logo dizendo. Fui logo repetindo o refrão dele. Ficou mais sossegado com a minha explicação. Caminhamos um pouco, conversando. Foi logo me dizendo da sua decepção com alguns ex-companheiros do colégio. Deixaram a religião, não vão à missa aos domingos, não rezam, têm procedimentos pecaminosos…Uma tristeza. Salve Maria! Salve, repetia eu às vezes.

Me disse ainda que não lia alguns livros ou não assistia a certos filmes uma censura severa. Fomos conversando as mesmas coisas, sempre intercalando Salve Maria. Cansado daquela ladainha, repentinamente, ao passar um ônibus, tomei-o, ele ainda em marcha lenta, a tempo de eu gritar um Salve Maria, a que não deixou  de responder com um vibrante Salve Maria.