Gosto muito de caminhar pelas ruas de Copacabana. Houve tempo, já afastado, em que preferia o calçadão. Queria pegar sol, exercitar as pernas, ganhar fôlego, cuidar, enfim, do físico. Só estudando e trabalhando não daria para me manter como um adulto e, quem sabe, como um velho saudável, com boa aparência, pois esta sempre teve o seu valor social. As aparências enganam, ouço de uma voz saída de não sei onde. Até concordo. Mas já como adulto maduro o físico passou a contar muito para mim. Ainda mais que na juventude mesmo não fui de cuidar dele, a exibir braços musculosos, ser um sarado, como se passou a dizer anos e anos depois. Não era tempo das academias. Na juventude. apenas umas aulinhas de natação e umas peladas em campos de várzea espalhados pelos subúrbios do Rio antigo.
Os anos correm muito depressa, envoltos na luta e obrigações do dia a dia. O cuidado com o físico era zero. O intelectual parece ter se apoderado de mim, não me largava. Atenção voltada para os cursos ministrados, leituras, palestras, congressos, bancas examinadoras e eventos acadêmicos outros. Atividade profissional intensa. E a atividade física?
Sem nenhum tempo para ela. Vejo hoje que o equilíbrio não me alcançara em largo período da minha vida. Entre uma caminhada no calçadão e a leitura de um livro recém-lançado, de leitura tida como obrigatória, que a caminhada ficasse adiada. E foi sendo adiada , largada mesmo.E na vida se paga sempre um preço, alguns bem elevados, pelas opções feitas.
O tempo, que acompanha a gente passo a passo, a partir de certo momento, me foi enviando alguns recadinhos. Olha a postura, endireita esta coluna, cabeça pra frente, abaixa os ombros… Sua barriga cresce a olhos vistos. Suas calças e camisas que o digam . Não lhe dava ouvidos. Embora já com dores aqui e ali, espalhadas pelo corpo , que, coitado , clamava por alguma providência de minha parte .Se sentia cansado com frequência . Só com espírito não dá não para andar pelas veredas da vida. Meros paliativos, às vezes com efeitos colaterais perigosos para a saúde, os analgésicos, os antiflamatórios e outros recursos medicamentosos objeto de divulgação enganosa.
Conversas com os médicos, daqueles que levam nossos queixumes a sério, solidários com as nossas dores. Seu corpo, me advertia o ortopedista, está cansado pela falta de exercício. A atividade física é que lhe sustenta a vida , é o remédio que lhe lubrifica músculos e articulações. O coração é um músculo. As articulações se espalham por todo o nosso esqueleto.Se lembre sempre disso. A minha prescrição é, pois, entrar para uma boa academia e deixar a preguiça de lado. E, brincando: um bom professor precisa de preparo físico, não? Como saltar a voz de uma pessoa que se cansa facilmente? Todos precisamos de preparo físico. Uma atividade aeróbica é essencial, sobretudo quando a mocidade já ficou para trás . A fala do médico foi, embora delicada, contundente.
Carecia eu tomar uma decisão, sem adiamentos. Academia, depressinha. Passei a procurar uma, bem outra esta da que tão bem conhecia Pergunto, aqui e ali, por uma indicação de conhecidos frequentadores .De início, você vai ser submetido a um teste, com tomada de pulso, de pressão, medições do corpo. Nossa, vou ser reprovado nesta altura da vida. Currículo? Zero. Me aconselharam um “personal” para ir me orientando. Fui aprovado no teste. Dizendo em termos mais realistas: me encaminhou o tal “personal” para fazer a matrícula…Garantia de mais um aluno.
Não é que me habituei rápido com o ambiente da academia escolhida?Houve aulas em que eu era o único aluno presente. Também neste horário, no meio da tarde ! Só para aposentados , me esclareceu um dos filhos. Bicicleta e exercícios diversos em aparelhos, reconheço , bem bolados. Depois de algumas aulas, já me sentia outro, com mais vigor, disposição. Dores? Só as musculares, por causa de certos exercícios. Logo passei a me sentir mais leve, aposentado não tem de ser, não deve ser, inativo. Barriga já é algo recalcitrante. Diminuir um furo no cinto, uma proeza.
Permaneci um bom tempo me exercitando na academia, tendo de vencer a preguiça muitas vezes. Me sentia um vitorioso. Eis quando veio a terrível pandemia , que, em pouco tempo, assustava todo o mundo . Todos em casa. Imagina continuar frequentando uma academia! Nem meu “personal” ia lá. Meses e meses assustado, pouco saindo. Tenho uma pequena bicicleta em casa.Pedalar é preciso. Qual nada, a apatia, o desânimo tomava conta de mim. Não para desfrutar de minhas guloseimas…Isto não .Na verdade, a gula tomou conta de mim. Calçadão? Nem pensar.
O cansaço foi vencendo. Engordava sob o protesto de minhas calças e camisas. Evitava qualquer espelho. As dores voltavam com intensidade. Retorno ao ortopedista. Seu mal é a falta de exercício. Já tinha ouvido tal sentença há uns bons anos.Mas agora maior intensidade nos exercícios aeróbicos, sob a batuta de uma fisioterapeuta. Eles são criativos , não nego, mas difíceis e cansativos. Me deixam exaustos. Passei a me considerar numa semi-pandemia , com a esperança de uma vida com menos limitações. Afinal, basta as impostas pela idade. Irreversíveis . Haja coragem para se envelhecer! O corpo em protesto permanente. A alma? Tem suas dores também. E como doem!