Seu andar flutuava. Seus pés apenas roçavam o chão. Suas sandálias exibiam pés delicados. Caminhava sempre devagar, com os movimentos dos braços a criarem uma coreografia. Cabelos soltos. Não era alta, nem baixa. Sua saia geralmente florida, rodada, ajudava ainda mais a configurar uma jovem espontânea, solta, a usufruir uma vida alegre e sem amarras.
Seu nome? Nunca soube. Tem importância? Certamente, um nome delicado. Nome de uma flor, quem sabe? Merecia. Algumas vezes nos esbarrávamos no corredor do andar do prédio em que se situavam os escritórios em que trabalhávamos. Não era de trocar olhares com ninguém, muito menos de conversinhas. Não, não era antipática. Gostava decerto de desfilar silenciosa por aquele espaço longo, sem correrias, sem atropelos. Às vezes entreabria um leve sorriso para alguém, algum colega.
Como me dirigir a ela? Soltava apenas um bom dia ou uma boa tarde, a que ela respondia bem baixinho .Jovem, de seus vinte e cinco anos, de trato fino, já se via, mantinha sua postura, longe de ser uma deslumbrada. Sua voz era macia , a revelar talvez a sua personalidade. Ao ascensorista é que manifestava a sua fala, através de breves frases.
Velhos conhecidos, o ascensorista e eu chegamos a manter rápidos diálogos, quando sozinhos no elevador. Patrão, o senhor trabalha no andar da princesa deste prédio. Ambos sorrimos, pois logo entendi a quem se referia. Ouve uns galanteios, paqueras mesmo, mas permanece séria. Muito distinta . Meu amigo ascensorista parecia já conhecê-la bem
Tínhamos assim no prédio uma jovem algo misteriosa para mim. E o mistério atrai. Muito. Não seria justamente o mistério o que me atraía nela?
Certo dia, ao entrar afogadamente no amplo elevador vazio, me deparo com ela em um canto. Dei um bom dia alto e… ouvi a resposta dela, num tom de voz suave, macio. Fixei os olhos na moça, que não manteve seu olhar em mim. Ao chegar ao nosso andar, dei-lhe passagem. Obrigada, sussurrou. Minha timidez, ou o receio da frustração, me travou iniciar um diálogo com ela.
Devíamos ser mais ou menos da mesma idade. O desejo de conversar com ela, de saber dela, ficou assim frustrado. Porém, alimentava a esperança de outros encontros no elevador. Oportunidades surgiriam com certeza. Dias que se passam, e nenhum reencontro. Numa manhã, afoito entro no elevador. O ascensorista, em voz baixa e cúmplice, me informa que a princesa do prédio não mais aparecera. Tinha saído do emprego, procurara saber.
Nem o seu nome ficara sabendo. E queria tanto saber dela, de como via o mundo, dos seus anseios ante a vida. Suas saias floridas, seu andar flutuante, sua voz macia, seus sorrisos meio escondidos deviam falar por ela. A vida tantas vezes não se manifesta assim a todos nós que dela desfrutamos? Parcialmente, nebulosamente, misteriosamente?