“A rosa que floresceu”

Reclamo às vezes do mundo digital. Coisa complicada! De início, ficava à beira de um ataque de nervos. Não nego que tenho avançado com o tempo. Devargazinho.  Verdade, comecei tarde . Tudo fica mais difícil. Me sinto ainda num curso de graduação. No celular, me julgo como aqueles alunos que ficam sempre para a prova final.

 O bom mesmo é que encontrei no computador o espaço ideal, já algum tempo, para me destravar a escrita. Ela passou a sair mais corrente, menos angustiada, visualizo melhor o que vou rascunhando. Antes, os meus rascunhos ficavam quase ilegíveis para mim mesmo, com tantos rabiscos, setas em todas as direções do papel, com anotações que preenchiam as margens… Um caos. Difícil  assim de  eu mesmo ler. Às vezes, era o texto de uma palestra, de uma arguição…Alguém sentado ao meu lado, em vendo o meu papel, devia se espantar : como pode?Que cabeça a deste sujeito!

Pois foi neste mundo digital que ousei começar a escrevinhar umas crônicas. É, bem tardinho, eu sei. Com muita insegurança, sem saber mesmo que  resultados  seriam alcançados. Que textos sairiam! Gostei da experiência. Fui em frente. Na verdade, a gente tem tanta coisa  para contar, do mundo  que observamos, das pessoas  que cruzaram e cruzam a nossa vida, de tantas lembranças que ficaram, algumas que nos deixam ainda pesarosos, mas outras nos fazem ainda hoje rir.Mas a lembrança ficou. Por quê?   Não quero a verdade, quero “ A rosa que floresceu” , a do poeta.

Que a imaginação, então, esteja ao nosso lado, a piscar para nós, a ficar nos namorando, convidando-nos para aventuras nunca dantes vividas. Fundamental. Sedução só. Lembro do Bandeira: “Não quero óculos nem tosse/ Nem obrigação de voto  . (…) Quero quero/Quero dar a volta ao mundo/Só num navio de vela”. Se não o tenho, por que não imaginá-lo?

 Sem um olhar atento para o mundo, sem lembranças que ficaram, sem doses de imaginação , não dá para cronicar com um intento expressivo-literário, timidozinho que ele seja, sem pretensões, imagina!,  de ser um Rubem Braga. Ah, protesta a linguagem: esqueceram de mim? Impossível. Sem ela, sem saber brincar com ela, sem piruetas com as palavras, sem dar a elas sentidos surpreendentes, sem recorrer o mais possível aos recursos que  cada língua nos disponibiliza , sem ficar preso a  um código severo , cheio de não-me toques,que limite o seu uso,  não dá mesmo para sair por aí tentando escrevinhar umas croniquetas com algum intento expressivo-literário. E afinando sempre este instrumento de trabalho que, por ser uma atividade, carece de prática e de zelo constantes .